Snuff films, mutações, culto de serial killer e investigação. Conheça a HQ mais maluca de Daniel Clowes: Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro
Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro (1993) é provavelmente o quadrinho mais maluco de Daniel Clowes. Entre 1989 e 1993, saiu pela primeira vez, nos volumes de #1 a #10 da revista independente Eightball. Mesma publicação em que, na edição #11, começou a ser publicado Ghost World (1993-1997).
Cada parte foi organizada como um capítulo da edição completa lançada em 1993 pela Fantagraphics Books, em formato de novela gráfica. O quadrinho saiu no Brasil em 2002 pela editora Conrad, com 148 páginas, P&B. Mais recentemente, em 2018, a Nemo fez a reedição, material fácil de encontrar hoje em dia.
Qual a trama Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro?
Clay Loudermilk entra em um cinema pornográfico parecendo meio deslocado daquele ambiente. O segundo filme apresentado é “Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro”, que o surpreende pela falta de nudez e por um detalhe aterrador.
Era um longa sadomasoquista cheio de personagens esquisitos e onde sua ex-mulher, Barbara Allen, aparecia como dominatrix. A então esposa sumiu sem grandes explicações, deixando uma lacuna.
Clay vê a ex em um filme sadomasoquista e consulta um adivinho no banheiro para saber seu paradeiro
Ao questionar sobre a produção para a funcionária do cinema, Clay recebe a dica de um transeunte: “…tenta no banheiro masculino, parceiro!” A fila termina na cabine sanitária em que Loudermilk encontra um adivinho. O homem é objetivo.
Dá o nome do grupo que fez o longa, “Produções Interessantes”, e diz que o escritório deles fica em Gooseneck Hollow, no condado de Blackjack.
O quadrinho ficou nonsense? Aviso, piora. A saga de Clay para encontrar Barbara tem início. E no caminho estarão diversos personagens bizarros com importantes participações no enredo, incluindo dois policiais sádicos que o espancam e um grupo religioso com características ripongas à la Família Manson – responsável por tentar envolver Clay em um atentado contra a presidência –.
Pouco depois, é a vez de o protagonista conhecer uma garçonete mutante que parece um peixe-humano e se apaixona por ele, além da mãe ninfomaníaca dela. É na casa de ambas que Loudermilk aluga um quarto para dormir.
A investigação do paradeiro de Barbara se cruza com uma teoria da conspiração em torno de Mr. Jones, um personagem visto inúmeras vezes em bonecos, logotipos e até em fotos nazistas da 2ª Grande Guerra. Quem o ajuda sobre o tema é um aficionado, Billings, dono de uma cadela sem orifícios – exatamente isso! – que terá papel crucial na HQ.
A dupla de policiais sádicos que abordam Clay inicia a onda de violência na HQ
Todo esse envolvimento de Clay com intrigas misteriosas – Mr. Jones, seita religiosa e produtora secreta de filmes – acaba gerando inimigos, muita violência e algumas reviravoltas.
Vale a pena ler?
Antes de tudo, é necessário posicionar essa HQ no catálogo de Daniel Clowes. Personagem obsessivo e clima de investigação estão presentes, o que se repetiria em outras obras (David Boring e Paciência).
Comparativamente ao clássico Ghost World, estamos no oposto. Saímos da aproximação crua com a realidade e fomos para o nonsense, teorias da conspiração e lendas urbanas. O que se repete em todas é a atenção especial ao psiquismo humano, mesmo que sem tanto aprofundamento aqui.
Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro tem um quê de A Família Addams e de surrealismo. No trato com as deformações físicas, faz lembrar o filme espanhol Peles (2017), de Eduardo Casanova, e o quadrinho Black Hole (1995), de Charles Burns. Portanto, espere imagens chocantes.
Tina, a gentil e maltratada garçonete mutante, se entrega de corpo e alma para o protagonista
É um quadrinho para prestar atenção nas minúcias, inclusive para entender a história, tendo em vista que não fica se autoexplicando em excesso. Uma dica é que os quadros que retratam lembranças e sonhos têm linhas levemente não uniformes, diferentes dos demais, em traço firme e reto.
Ótima sugestão para quem gosta de perseguir referências e easter eggs. “Barbara Allen” é uma música folclórica anglo-saxã cuja história tem paralelos na personagem homônima.
Os filmes Feriado no Harém (1965) e Faster, Pussycat! Kill! Kill! (1965) são homenageados. Mesmo um assalto ao famigerado âncora americano Dan Rather em 1986, posteriormente também citado pela banda R.E.M. na música “What’s the Frequency, Kenneth?“, está referenciado. E por aí vai.
Os snuff films, segundo a lenda urbana, longas onde as cenas de morte e assassinatos acontecem de verdade, são utilizados de forma estrutural na obra. A cultura pop norte-americana parece destroçada e cômica nas mãos de Clowes. E facilmente percebemos a ironia com os padrões daquela região, bem como seus opostos.
Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro é um quadrinho para quem preza por estranhezas, toques de terror, investigação e humor ácido refinado. A arte de Clowes já tinha estilo autoral. O roteiro é relativamente simples, mas as diversas camadas e detalhes dão complexidade. O impacto da leitura fica após a conclusão.
Gostou do texto? Conheça outras HQs de Daniel Clowes por David Horeglad (HQ Ano 1):
David Boring (2000) – O Ultimato
Ghost World (1997) – O Ultimato

Avaliação: Ótimo!
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Créditos:
Texto: David Horeglad – @hq_ano1
Imagens: Reprodução
Edição: Diego Brisse
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