Angelo Agostini, um dos maiores desenhistas brasileiros a deixar importante legado para as histórias em quadrinhos, autor de As Aventuras de Nhô Quim em 1869, trouxe novos contornos para a cultura brasileira. De lá para cá, vários autores e desenhistas brasileiros inovaram o cenário das narrativas sequenciais com histórias divertidas, com críticas socioculturais e históricas contundentes.
Assim é A Liga dos Pampas: O Entrevero Sinistro, com roteiro e arte de Guilherme Smee e Jader Corrêa, respectivamente. Uma história em quadrinhos que mistura folclore brasileiro, aventura, mistério e uma pegada de terror lovecraftiana. Aprochegue-se com o Ultimato do Bacon nessa aventura e desvende o sobrenatural nesta Semana do Quadrinho Brasileiro numa história que promete arrepios.
Enredo Permeado Por Lendas do Folclore Gaúcho
A trama de A Liga dos Pampas transporta o leitor para o ano de 1893, em meio a Revolução Federalista – um conflito ocorrido na Região Sul do Brasil e que trouxe divisões para o país. De um lado, os republicanos que defendiam maiores poderes para o presidente da República e, do outro lado, aqueles que apoiavam uma descentralização do poder, com maior participação dos Estados.
A narrativa percorre tal evento histórico brasileiro para contar um causo profano que “por pouco não causou um grande malogro no mundo.” A partir daí, somos apresentados aos personagens centrais da Liga que são, na verdade, personagens do folclore gaúcho e de um enredo que trata de mundos fantásticos e criaturas sobrenaturais ao estilo lovecraftiano.
A Liga dos Pampas (da esquerda para direita): Martín Fierro, Blau Nunes, Teiniaguá, Anguera e Negrinho do Pastoreio (abaixo)
Fãs de quadrinhos, literatura e cinema ficarão felizes em ver que a obra pega carona na onda de heróis e equipes como, por exemplo, os Vingadores. Mas, ao ler, fica nítida a semelhança com outra equipe formada por personagens da literatura que são transportados para os quadrinhos, a Liga Extraordinária de Alan Moore. Porém, a Liga dos Pampas é reunida e forma uma equipe inusitada composta por:
- Anguera: índio nativo que, em linguagem guarani, significa Fantasma. Sendo batizado pelos padres jesuítas, recebeu também o nome de Generoso.
- Negrinho do Pastoreio: criança negra, escrava e submetida a maus tratos. Segundo a lenda, foi colocada sobre um formigueiro para ser devorada até a morte mas que, no entanto, foi salva por Nossa Senhora;
- Salamanca do Jarau, também conhecida como Teiniaguá: princesa moura (mulçumanos) que se transforma em uma bruxa e que vem em uma urna de Salamanca, na Espanha, para uma caverna no Cerro do Jarau, em Quaraí, Rio Grande do Sul.
- Martín Fierro e Blau Nunes: ambos gaúchos que representam a combatividade sulista presente na literatura de José Hernandez e Simões Lopes Neto, respectivamente.
- Boi das Aspas de Ouro: também conhecido como Boi Barroso, um ser mágico que atrai a felicidade para quem o encontra.
O grupo atravessa uma jornada intrincada de perigos no meio do pampa gaúcho para lutar contra um mal sobrenatural com ares mitológicos lovecraftianos que deseja exterminar a humanidade.
Imaginário Popular
O imaginário popular se desenvolve em torno de temas que constituem o núcleo dos quais se organizam a vida humana. E o que A Liga dos Pampas aborda (política, religiosidade, misticismo e literatura) possui grande peso, pois é uma forma divertida e lúdica de apresentar a história de um povo ou nação – como é o caso da colonização do Estado do Rio Grande do Sul e suas lendas locais.
Os contos eram narrados, em grande parte, por narradores que confabulavam histórias que mantinham acesa a chama do imaginário popular.
A Liga dos Pampas, portanto, cativa o leitor justamente por fazer bom uso do folclore, contos e causos narrados pelos mais velhos que, em volta de fogueiras, contavam histórias sobre guerreiros em meio a paisagens hostis. Através deste imaginário popular, é possível falar sobre a história de culturas diferentes, crenças e ideologias. O imaginário, portanto, é o espírito de um povo e a raíz de tudo aquilo que existe na humanidade.
Referências Lovecraftianas
Reverenciado mundialmente como mestre da literatura de terror, Howard Philips Lovecraft é reconhecido pela criação de um vasto universo ficcional que tem no horror cósmico o elemento primordial de suas obras.
Em sua narrativa literária, Lovecraft trata de histórias repletas de seres míticos e ancestrais – os Grandes Antigos – que habitaram a Terra antes da humanidade e causam horrores indescritíveis naqueles que ousam conhecê-los profundamente.
Releitura de Boitatá, seguindo uma linha semelhante aos monstros lovecraftianos: criatura sobrenatural de pura maldade que vive nos rincões Riograndenses
Em Liga dos Pampas: O Entrevero Sinistro, o grande mal ancestral possui relações estreitas com a mitologia lovecraftiana e, ao mesmo tempo, honra as lendas folclóricas riograndenses. Como diz o texto, “havia uma catinga que emanava a pura ruindade! A criatura maligna […] o Boitatá havia pisado neste rincão em eras passadas. E eles tinham certeza que, desta vez, ele nunca sossegaria enquanto não tivesse engolido a luz da alma de todo o vivente neste planeta.”
Conclusão
A Liga dos Pampas leva o leitor a se aventurar numa narrativa mística e cheia de mistérios a partir do imaginário da cultura gaúcha, sempre respeitando as tradições, costumes e beleza dos contos que permeiam a história desse cantinho do Brasil. Tem-se em mãos uma HQ com ares de mistério, suspense, um leve toque de horror e, claro, ação.
O folclore gaúcho é apresentado por meio de personagens cativantes e um cenário fantástico (diga-se, fantasia) utilizando elementos sobrenaturais como recurso para criação de uma narrativa coesa, com parâmetros para ser indicada até mesmo em escolas. Afinal, a cultura de um povo é referenciada nesta história em quadrinhos de maneira divertida e lúdica.
Talvez, poucos conheçam as histórias do Negrinho do Pastoreio ou da Salamanca do Jarau, dois personagens da tradição gauchesca e eis, portanto, um dos grandes méritos de Liga dos Pampas, quer seja potencializar uma porta de entrada para novos leitores e apresentar de forma bacana uma aventura que homenageia uma parte do folclore do nosso país.
Algo que deveria ser explorado por escolas e bibliotecas a fim de que crianças e adolescentes tivessem maior contato com novas culturas e conhecimentos.
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Avaliação: Bom!
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Créditos:
Texto: André ‘Brasuka” Roberto – @Comunicafic
Imagens: Reprodução
Edição: Diego Brisse
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